segunda-feira

água na torneira

A gente só está aqui – falando em arte, literatura, música – porque tem água na torneira.
Pausa depois de tal declaração. Fumando, atenção desinteressada dela.
Água sempre foi civilização, ou ao contrário, uma civilização só surge e se mantém por causa do acesso que tem à água. Civilização é o tipo de cultura, e são várias, que dá importância para essas frescuras – arte, poesia, teatro.
As cidades atuais e as do passado têm em comum justamente a água: o número de habitantes e as condições de vida e saúde necessárias para o surgimento de atividades que não sejam as de sobrevivência foram determinados pelo acesso aos recursos hídricos.
Um pingo de história cultural da água: Roma só se expandiu porque edificou, ao longo dos anos, um sistema extenso de aquedutos, construções pelas quais os romanos ficaram famosos, assim como por seus banhos públicos, da mais alta tecnologia para a época.
Em Roma, foi só um pequeno grupo de bárbaros destruir o sistema hidráulico, em 437, para a cidade descer, rapidamente, dos seus mais de dois milhões de habitantes para algumas almas sedentas concentradas nas margens do Tibre. Alguns autores afirmaram que a cidade ficou despovoada por um tempo. Várias cidades e povos, nos mais diversos períodos, floresceram como nunca e morreram por causa da água.
E eu aqui nessa lenga-lenga sobre água, civilização, chatice. Poderia citar muito mais exemplos, sou historiador erudito, mas apostei com a minha namorada que terminaria esse texto - sobre qualquer coisa - em 15 minutos. Uma corrida jornalística que, do meu ponto de vista, fode com qualquer um dos meus ricos argumentos e pretensões de mergulhar na profundidade. Aceitei.
Atalho. Imagino faltando água aqui hoje, agora, a partir desse momento e para sempre, nessa minha cidade alegre que eu namoro pela janela. Dois dias para a água da caixa d'água acabar – estimativa otimista, estamos no meio do carnaval e a cidade está vazia. Mais segunda, terça e quarta até a vontade de abandonar a cidade – dizem que é esse o tempo que sobrevive uma população sitiada sem líquido bebível.
Você pode perguntar onde estão as autoridades que deveriam dar um jeito nisso, mas eu garanto que, nesse exato momento, não há como pressioná-las: o prefeito nunca mais foi visto, a governadora está deprimida, com problemas conjugais. E o presidente, bom, é carnaval, entende.
Sem um gole de água, acho que eu e a minha namorada ficaríamos por aqui mesmo, acabaríamos com todos os víveres, provocando mais sede talvez; ela pintaria no seu atelier e eu leria ou escreveria alguma porcaria. Bebendo a última cerveja. Ouvindo música. Têm mais 2 minutos, mas acabou.

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito massa o texto ainda mais para 13 minutos. Te falei ontem que curto historia pra caramba deviamos ter falado mais em civilizacoes do passado ontem eheheh
abraço